Jimmy P: “Fui-me tornando mais sensível, e tinha vergonha disso. Com a idade, percebi que não é uma coisa má, acho que é um superpoder”
Entre a maldição e a bênção de uma noite que lhe poderia ter custado a vida, Jimmy P encontrou o impulso que faltava para se dedicar inteiramente à música. “Quando saí do hospital, montei o meu estúdio em casa. Estava praticamente de cama, mas com uma mão conseguia ir ao computador e gravar. Queria muito aquilo, e estava a sair-me da alma”, conta o artista neste episódio d’ O Tal Podcast. As memórias remontam a 2011, marcam o início de uma carreira bem-sucedida – “O meu primeiro som a ter sucesso foi depois disso” –,mas, antes desse salto criativo, recuam a história do artista a um passado de excessos. “Eu podia não estar vivo, ou não ter o braço”, sublinha, expondo as cicatrizes de uma série de cirurgias, vividas durante mais de dois meses de hospitalização. “Tinha acabado a faculdade há cerca de três anos, e fui trabalhar para uma empresa grande do têxtil. Foi-me atribuído um lugar de chefia, ganhava bem, viajava muito, e gostava verdadeiramente daquilo, mas não estava preparado para aquela maratona”. Além dos voos profissionais, demasiado altos naquela fase, Jimmy tinha embarcado numa relação abusiva, e, a determinada altura, o consumo de álcool e drogas tornou-se habitual. Por isso, ao acordar e se deparar com o ortopedista que o operou, a confusão ainda era total. “Eu não me lembrava de nada, e a minha primeira pergunta foi: é da polícia?”. A ligação médico-paciente evoluiu para a amizade e, hoje, o músico cuida não apenas das marcas que deixam visíveis cicatrizes na pele, mas também daquelas invisíveis, que criam feridas emocionais. “Ter tido alguns problemas de saúde mental permitiu desconstruir-me, e perceber certos comportamentos”, nota Jimmy, recém-regressado de uma paragem de um ano, e já consciente dos padrões que foi reproduzindo. “Durante muito tempo, era duro e muito exigente comigo, e se calhar elogiava pouco as minhas conquistas e as coisas boas que fazia. Hoje tenho uma relação muito mais saudável comigo”. O diagnóstico inclui mais autoconhecimento: “Fui-me tornando mais sensível, e tinha vergonha disso. Com a idade, percebi que não é uma coisa má, acho que é um superpoder”. Ao mesmo tempo, essa consciência é indissociável do entendimento com os pais. “A minha mãe saiu de casa para me ter, com 18 ou 19 anos. Foi um ato de coragem e de amor gigante, mas nem sempre consegui ver assim”, admite, sublinhando o apoio incondicional que sempre recebeu do pai, o ex-futebolista Jorge Plácido. “Estou a educar as minhas filhas, mas preciso de olhar muito para mim para conseguir ser um bom pai”. No processo de se reconciliar com a própria história e a dos pais, Jimmy defende a importância dessa autoanálise – “Nunca subi a um palco alcoolizado ou drogado, porque quero ter noção do que está a acontecer, quero desfrutar da experiência e quero vibrar na frequência certa” –, que recentemente se cruzou com a espiritualidade africana. “Durante anos ouvi dizer que era coisa do demónio, feitiçaria, magia negra e todas essas expressões”, nota, assumindo o compromisso de questionar o que aprendeu. “Tudo começou quando fui ao Senegal. Senti uma ligação muito forte, e a primeira coisa que fiz quando cheguei a Portugal foi um teste de ancestralidade, que revelou que 50% do meu ADN é daquela zona”. Nesta conversa com Georgina Angélica e Paula Cardoso, Jimmy P revela ainda como constrói a sua sorte e resiliência: “Não foram as 10 músicas que tiveram sucesso que me tornaram o artista que sou. Foram as outras que ninguém ouviu”.See omnystudio.com/listener for privacy information.